A HERMENÊUTICA DE ATOS III
– Alguns Princípios Específicos

de Gordon Fee e Douglas Stuart

Com estas observações e princípios gerais em vista, ofereceríamos as seguintes sugestões quanto à hermenêutica dos precedentes bíblicos:

1. Provavelmente nunca é válido usar uma analogia baseada em precedentes bíblicos para dar autoridade bíblica para as ações dos dias atuais. Por exemplo, a porção de lã de Gideão tem sido usada repetidas vezes como uma analogia para descobrir a vontade de Deus. Visto que Deus graciosamente condescendeu com a falta de confiança da parte de Gideão, Ele pode fazer o mesmo com a dos outros, mas não há autoridade ou encorajamento bíblico para tais ações.

De modo semelhante, há aqueles que argumentam em prol do batismo no Espírito Santo como sendo subseqüente à salvação, com base na analogia de Jesus, que nasceu do Espírito e, no Seu batismo, foi revestido do poder do Espírito. Semelhante analogia, porém, por interessante que seja, realmente é irrelevante, visto que a experiência cristão é uma coisa radicalmente diferente do nascimento de Jesus pelo Espírito. Se tudo na vida de Jesus fosse normativo para nós, seria esperado de todos nós que morrêssemos crucificados e fôssemos ressuscitados três dias mais tarde.

2. Embora talvez não tenha sido o propósito primário do autor, as narrativas bíblicas realmente têm valor ilustrativo e, às vezes, valor como “padrão”. Realmente, é assim que pessoas no Novo Testamento ocasionalmente usavam certos precedentes históricos do Antigo Testamento. Paulo, por exemplo, empregou alguns exemplos tirados do Antigo Testamento como advertências para aqueles que tinham uma falsa segurança na sua eleição divina (1 Co 10.1-13), e Jesus empregou o exemplo de Davi como um precedente histórico para justificar as ações dos Seus discípulos no sábado (Marcos 2.23-28 e paralelos).

Ninguém entre nós, porém, tem a autoridade de Deus para reproduzir o tipo de exegese e análises analógicas que os autores do Novo Testamento ocasionalmente aplicavam ao Antigo Testamento. Deve ser notado especialmente em casos em que o precedente justifica uma ação presente, que o precedente não estabelece uma norma para a ação especifica. Os homens não devem comer regular-mente dos pais da proposição ou colher grãos no sábado para demonstrar que o sábado foi feito para o homem. Pelo contrário, o precedente ilustra um princípio no que diz respeito ao sábado.

Uma advertência está em ordem aqui. Para um precedente bíblico justificar uma ação atual, o princípio da ação deve ser ensinado em outro texto, onde é a intenção primária ensinar assim. Por exemplo, usar a purificação do templo feita por Jesus para justificar a assim-chamada indignação justa dalguém — usual-mente um eufemismo para a ira egoísta — é abusar deste princípio. Do outro lado, podemos corretamente basear a experiência atual de falar em línguas não somente no precedente (em Atos) como também no ensino sobre os dons espirituais em 1 Coríntios 12 – 14.

3. Em questões da experiência cristã, e até mais da prática cristã, os precedentes bíblicos podem às vezes ser considerados padrões repetíveis ainda que não devam ser considerados normativos. É especialmente o caso quando a prática é obrigatória mas seu modo não o é.

A decisão quanto a certas práticas ou padrões serem repetíveis deve ser orientada pelas seguintes considerações. Primeiramente, o argumento mais forte possível pode ser feito quando um só padrão é achado (embora devamos tomar cuidado em não dar importância demasiada ao silêncio), e quando aquele padrão se repete dentro do próprio Novo Testamento. Em segundo lugar, onde há uma ambigüidade de padrões, ou quando um padrão ocorre uma só vez, é repetível para cristãos posteriores somente se parecer ter aprovação divina ou estiver em harmonia com aquilo que é ensinado noutros lugares da Escritura. Em terceiro lugar, aquilo que é culturalmente condicionado, ou não é repetível de modo algum, ou deve ser traduzido para a cultura nova ou diferente.

Conseqüentemente, à luz destes princípios, podemos formar um argumento muito forte em prol da imersão como sendo o modo do batismo, um argumento mais fraco em prol da observância da Ceia do Senhor todos os domingos, mas quase nenhum argumento a favor do batismo das crianças (este pode, naturalmente, ser argumentado a partir do precedente histórico na igreja, mas não tão facilmente do precedente bíblico, que é a questão em pauta aqui). Da mesma forma, a função do ministro cristão como sacerdote fracassa em todos os casos, em termos da sua base bíblica.

Não imaginamos com isto que solucionamos todos os problemas, mas pensamos que são sugestões funcionais, e esperamos que levem você a pensar exegeticamente e com maior precisão hermenêutica enquanto ler as narrativas bíblicas.

[Em breve, Deus permitindo, iremos reproduzir nesta seção mais princípios da interpretação dos senhores Fee e Stuart do seu livro “Entendes o Que Lês?”]

Copyright © 1984 Edições Vida Nova. Todos os direitos reservados.
Reproduzido com a devida autorização.

O livro de Gordon D. Fee e Douglas Stuart do qual este texto foi extraído, “Entendes o que Lês?“, pode ser encomendado da Edições Vida Nova
selecionando a capa do livro ao lado:  


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