Devo Aprender A Como Interpretar A Bíblia?
(Continuação) de D. A. Carson
Princípio XI
Você Também Está Culturalmente E Teologicamente Situado
Em outras palavras, não é simplesmente um caso de que cada parte da Bíblia esteja culturalmente situada, enquanto eu e você formos apenas observadores neutros e impassíveis. Pelo contrário, leitores atentos reconhecerão que eles também estão situados em uma cultura específica. Eles estão submersos em uma linguagem específica, pressuposições não reconhecidas, perspectivas quanto ao tempo, raça, educação e humor, noções sobre a verdade, honra, e riqueza.
Em mãos pós-modernas, claro, essas realidades se tornam parte da razão na argumentação de que todas as interpretações são relativas. Eu argumentei em uma outra ocasião que, embora nenhum ser humano finito e pecaminoso possa conhecer a verdade exaustivamente sobre qualquer coisa (isto requereria onisciência), ele pode saber alguma parte da verdade, verdadeiramente. Mas freqüentemente isto requer um certo autodistanciamento de nós mesmos de pressuposições e perspectivas herdadas.
Algumas vezes isto se alcança inconscientemente. A pessoa que tem lido a sua Bíblia de capa a capa, uma ou duas vezes ao ano, a ama muito, e que agora no seu octoagésimo ano a lê com o mesmo amor, pode nunca ter se distanciado deliberadamente de seus preconceitos culturais. Mas ela pode agora estar tão imersa em uma perspectiva e mentalidade bíblica, que chega a viver em um “mundo” diferente daquele dos seus vizinhos pagãos, e talvez até mesmo de muitos dos seus vizinhos cristãos superficiais e menos bem informados.
Mas o processo pode ser acelerado lendo de modo refletivo, autocrítico, humilde, honesto, portanto, descobrindo onde a Palavra desafia as perspectivas e valores do nosso próprio tempo e espaço. O processo é acelerado por certos tipos de pequenos grupos de estudos bíblicos, isto é, aqueles que incluem cristãos devotos de outras culturas e os melhores sermões.
Nossa cultura ocidental coloca muita ênfase no individualismo ao ponto de acharmos difícil perceber, não apenas as ênfases bíblicas sobre a família e o corpo da igreja, mas também nas formas pelas quais Deus julga culturas e nações inteiras pelo acúmulo de corrupção de seus povos. Estão as interpretações bíblicas promovidas por “feministas evangélicas” comprometidas por suas obrigações com o atual foco na liberação das mulheres? Ou estão as interpretações de exegetas mais tradicionais comprometidas com a sujeição inconsciente de pressuposições patriarcais? Será que negligenciamos algumas das passagens “difíceis” sobre a pobreza simplesmente porque a maioria de nós vive em relativa riqueza?
Há uma legião de exemplos. Mas o lugar para se começar é no reconhecimento de que nenhum intérprete, incluíndo eu e você, aborda o texto com as nossas mentes como uma folha em branco. Há sempre uma necessidade de reconhecimento honesto das nossas tendências e pressuposições, e um desejo progressivo de reformá-las e desafiá-las à medida que a Palavra de Deus nos leva a uma direção bem diferente.
À proporção que nossa cultura se torna progressivamente mais secularizada, a necessidade deste tipo de leitura se torna mais urgente. Como é feito, tanto teoricamente e empiricamente, não pode ser elucidado aqui. Mas isto deve ser feito, a menos que nós domestiquemos as Escrituras aos nossos próprios mundos, disto não há dúvida.
Veja também “Tome Cuidado Como Você Aplica Narrativas”
Copyright © 1996 Modern Reformation Magazine. Todos os direitos reservados. Reproduzido com a devida autorização. Esta tradução é © Copyright 2013 www.hermeneutica.com para a língua portuguesa.
O Dr. D. A. Carson ensina Novo Testamento na Trinity Evangelical Divinity School e tem mais de vinte livros do seu próprio punho, entre as quais em português temos: “Comentário do Evangelho de João” da Shedd Publicações e “Os Perigos da Interpretação Bíblica” e “Introdução ao Novo Testamento” (co-editado com Douglas Moo e Leon Morris), ambos da Editora Vida Nova.